nº 136 - Ave Marciana



Autor: Edmund Cooper
Título original: A Far Sunset
1ª Edição: 1967
Publicado na Colecção Argonauta em 1968
Capa: Lima de Freitas
Tradução: Eurico da Fonseca

Súmula - foi apresentada no livro nº135 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta": 

Edmund Cooper volta a figurar na Colecção Argonauta com um dos seus romances mais brilhantes: Ave Marciana. A invulgar qualidade do seu estilo e da sua imaginação, fazem desta obra uma das mais sensacionais que entre nós se publicaram. As suas primeiras páginas introduzem-nos, desde logo, no clima de uma narração que, até ao fim, não mais deixará de nos prender:

A nave interstelar explodiu em glória, como os três sabiam que aconteceria, no trigésimo quinto dia da sua detenção nas masmorras de Baya Nor. Se eles compartilhassem da mesma cela, teriam podido ajudar-se uns aos outros, mas desde o dia da sua captura que haviam sido mantidos separados. Os seus únicos contactos eram a "noia" que vivia com cada um deles e os guardas que lhes traziam a comida.
A explosão foi como um tremor de terra. Abalou as próprias fundações de Baya Nor. O deus-rei consultou o seu conselho, o conselho consultou o oráculo; e o oráculo consultou os ossos sagrados, tremeu, entrou em transe e mergiu dele passado um tempo considerável, para anunciar que aquilo era o sinal de Oruri, que Oruri designara Baya Nor para a grandeza e que a chegada dos estranhos era um presságio favorável.
Os estranhos, no entanto, nada souberam dessas deliberações. Estavam encarcerados com as suas "noias" até que fossem suficientemente racionais - o que queria dizer: até que aprendessem a linguagem - para serem admitidos à presença do deus-rei.
Infelizmente o deus-rei, Enka-Ne, o 609º, não estava destinado a conhecê-los a todos por que a destruição da nave interstelar foi uma experiência muito traumática. Todos os estranhos possuíam um relógio electrónic; por isso, tinham podido contar os dias com a maior precisão. E todos eles sabiam qual o minuto em que o computador principal confessaria finalmente a si próprio que a tripulação ou abandonara a nave ou não podia voltar a ela. O computador principal - por razões óbvias às pessoas que haviam construído a nave - estava programado para para nesse momento programar a destruição. O que significava simplesmente que os comandos eram retirados do gerador nuclear. O resto aconteceria por si mesmo.
Cada um dos estranhos, no seu cárcere, começara a fazer uma contagem particular, aguardando simultâneamente que um ou mais dos outros nove membros da tripulação voltassem a tempo. Nenhum voltara. E assim a nave interstelar transformou-se numa nuvem em forma de cogumelo, um círculo de fogo ardeu até se extinguir nas florestas ao norte de Baya Nor, e uma pequena cratera de paredes vítreas ficou ali para recordar o acontecimento.
Nas masmorras de Baya Nor, o segundo-engenheiro enlouqueceu. Enrolou-se sobre si próprio como um feto. Mas como não se encontrava dentro de um útero e como não havia um cordão umbilical para lhe fornecer o sustento, e como a "noia", que era a sua única companhia, nada sabia sobre a alimentação intravenosa, acabou por morrer de fome.
O navegador-chefe reagiu com violência. Estrangulou a sua "noia" e depois conseguiu enforcar-se.
Por estranho que parecesse, o único membro da tripulação que conseguiu manter-se são de espírito e sobreviver, foi o psiquiatra da nave. Sendo por temperamento inclinado ao pessimismo, passara os últimos quinze dias do seu cativeiro a condicionar-se psicológicamente.
E assim, quando as masmorras tremeram, quando a sua "noia" se escondeu sobre o leito e quando com os olhos do seu espírito viu a bela forma da nave interstelar converter-se instantâneamente numa grande bola de fogo, repetiu a si próprio, hipnóticamente: "o meu nome é Poul Mer Lo. Sou um estranho. Mas este planete será o meu lar. É aqui que devo viver e morrer. É onde eu agora pertenço..."
Apesar das lágrimas que corriam pelas suas faces, sem ele dar por isso, Poul Mer Lo sentia-se extraordinariamente calmo. Olhou para a sua "noia", escondida debaixo da cama. Ainda que ele não entendesse perfeitamente a linguagem, compreendeu que ela estava a murmurar uma espécie de reza para afastar os espíritos maus. De repente, sentiu uma estranha e tremenda piedade. - Mylai Tui - disse ele, dirigindo-se-lhe formalmente. - Não há nada a temer. O que sentiste e ouviste não é a cólera de Oruri. É uma coisas que eu compreendo, ainda que não possa explicar-te. É uma coisa muito má, mas sem perigo para ti ou para o teu povo.
Mylai Tui saíu debaixo da cama. Em trinta e cinco dias e noites, aprendera muita coisa sobre Poul Mer Lo. Dera-lhe o seu corpo, dera-lhe os seus pensamentos, ensinara-lhe a língua de Baya Nor. Rira-se do embaraço e da estupidez dele. Fora surprendida pela sua ternura e admirara a sua amizade. Ninguém - mas ninguém - concedera alguma vez a sua amizade a uma simples "noia".  Excepto o estranho, Poul Mer Lo.
- O meu senhor chora - disse ela, incerta. - Eu tirei coragem das palavras de Poul Mer Lo. Mas a sua coragem é a minha coragem. Portanto, eu também devo chorar.
O psiquiatra olhou-a, perguntando a si próprio como poderia expressar-se numa linguagem que não parecia ter mais do que algumas centenas de palavras diferentes. Tocou no rosto dele e ficou supreendido ao encontrar lágrimas.
- Choro - disse ele calmamente - por causa da morte de uma grande e bela árvore. Choro porque estou muito longe da terra de meu povo, e não creio que possa lá voltar... - Hesitou. - Mas sinto-me satisfeito por te ter conhecido, Mylai Tui. E sinto-me também satisfeito por ter decoberto o povo de Baya Nor.
A rapariga olhou para ele.
- O meu senhor tem o dom da grandeza - disse ela, simplesmente. - Certamente que o deus-rei olhará para si e será sábio.
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Não deixe de ler este sensacional romance de Edmund Cooper,  Ave Marciana.

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