nº 279 - A Revolta das Máquinas 2



Autor: Clifford D. Simak
Título original: Skirmish
1ª Edição: 1977
Publicado na Colecção Argonauta em 1980
Capa: A. Pedro
Tradução: Eurico da Fonseca 

Súmula - Foi apresentada no livro nº278 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta":

O segundo volume da colectânea A Revolta das Máquinas (Skirmish), de Clifford D. Simak, inclui histórias clássicas como The Big Front Yard, The Thing in the Stone, The Autumn Land e The Ghost of a Model T.
Desta última, que tem por figura central um velho carro Ford modelo T, reproduzem-se algumas passagens: 

O carro chegou junto dele e parou. Não havia nada de mal nele. A porta direita da frente (a única porta da frente, porque não havia porta do lado esquerdo - abriu-se sozinha, porque não havia ninguém no carro para a abrir. O facto de a porta se abrir não o surpreendeu, porque tanto quando se lembrava, ninguém que possuísse um modelo T conseguira manter essa porta fechada. Era presa por um simples trinco e cada vez que o carro saltava (e eram poucas as ocasiões em que ele não andava aos saltos, devido ao estado das estradas desses dias, à dureza dos pneus e à construção das molas) - cada vez que o carro saltava a maldita porta da frente abria-se. 
No entanto daquela vez - após tantos anos - parecia haver qualquer coisa especial na maneira como a porta se abrira. Parecia uma espécie de convite, o carro parara e a porta não se abrira subitamente, mas sim com um floreado, como se o convidasse a entrar no carro. 
Portanto ele entrou e sentou-se no lugar da frente do lado direito e assim que entrou e se sentou a porta fechou-se e o carro começou a rolar pela estrada. Começou a mover-se para se colocar atrás do volante porque não havia ninguém a conduzir e estavam a aproximar-se de uma curva, e o carro necessitava de alguém para o guiar através da curva. Mas antes que pudesse mudar de lugar e pôr as mãos no volante, o carro começou a descrever a curva com tanta perfeição com se houvesse alguém a guiá-lo. Ficou estupefacto e não tocou em nada, e para além da curva havia uma subida comprida e íngreme, e o motor esforçou-se bravamente por alcançar a velocidade necessária para vencer a subida. 
O que havia de curioso naquilo, disse ele a si próprio, ainda meio agachado para pegar no volante mas ainda sem o tocar, era o facto de conhecer perfeitamente aquela estrada, e saber que não havia curva nem rampa. A estrada prolongava-se por quase cinco quilómetros antes de  entroncar na River Road, e não havia qualquer curva ou cotovelo nela, e sem dúvida nenhuma rampa. Mas ali houvera uma curva e agora havia uma rampa, pois que o carro ao subi-la perder rapidamente a sua velocidade e tivera de mudar para primeira. 

Da novela Um Pátio Enorme, se dá um breve extracto:  

Taine ficou na sombra, a ver o vulto escuro de Henry atravessar o pátio da Viúva Taylor até à rua atrás da sua casa. Encheu os pulmões com o ar fresco da noite e abanou a cabeça para eliminar o zumbido que sentia nela, mas o zumbido continuou.
Tinham acontecido demasiadas coisas. Demasiadas para um só dia - primeiro o tecto e agora o receptor de TV. Depois de um bom sono talvez ficasse em estado de tentar compreender aquilo.
"Towser" apareceu da esquina e coxeou lentamente pelos degraus acima até parar em frente do dono. Estava cheio de lama até às orelhas. 
- Tiveste um belo dia - notou Taine. - E, como te disse, não apanhaste o leirão.
- Woof - respondeu "Towser", tristemente.
- És como todos nós - afirmou-lhe Taine, num tom severo. - Como eu, Henry Horton e todos os outros. Andas atrás de qualquer coisa e pensas que andas à caça, mas na verdade não andas. E o que é pior é que não fazes a menor ideia da razão porque andas à caça.
"Towser" bateu com a cauda, fatigada, sobre o patamar. 
Taine abriu a porta e desviou-se para o lado para deixar "Towser" entrar. Depois entrou também.
Dirigiu-se ao frigorífico e tirou dele parte de um assado, uma fatia ou duas de carne picada para lanche, um pedaço de queijo seco e meia terrina de esparguete cozido. Fez café e e seguida partilhou a comida com "Towser". 
Depois Taine desceu as escadas e desligou o receptor de TV. Procurou uma lâmpada de inspecção, ligou-a e inspeccionou com ela o interior do aparelho.
Agachou-se no chão, segurando a lâmpada, tentando descobrir o que tinha sido feito ao aparelho. Estava diferente, sem dúvida, mas era difícil descobrir de que maneira estava diferente. Alguém mexera nas válvulas e lhes mudara a forma, e havia pequenos cubos de metal metidos aqui e ali de uma maneira que parecia totalmente ao acaso e sem lógica - ainda que Taine admitisse que talvez não fosse o caso. E o circuito fora transformado, com muitas outras ligações adicionadas.
A coisa mais surpreendente é que tudo aquilo parecia ter sido improvisado - como se alguém tivesse feito um trabalho apressado para pôr o aparelho em funcionamento numa emergência e de um modo temporário.
Alguém!
E quem poderia ser esse alguém?
Espreitou em volta, no cantos escuros da cave, e sentiu inúmeros insectos imaginários, com muitas patas, a correrem-lhe ao longo do corpo.
Alguém tirara a parte traseira da caixa do aparelho e colocara-a encostada à bancada, deixando os parafusos que retirara numa fila muito bem arrumada no chão. Depois, ele ou eles tinham arranjado de improviso o aparelho - tinham-no posto melhor do que alguma vez ele estivera.
Se aquilo fora um trabalho de improviso, o que seria se eles tivessem tido tempo de o fazer bem feito?
Não tinham tido tempo, evidentemente. Talvez tivessem fugido assustados quando ele voltara a casa - fugido mesmo antes de poderem voltar a colocar a tampa no aparelho.
Levantou-se e afastou-se, a passos rápidos.
E o tecto, pensando bem, não era exactamente um tecto. Outro revestimento, se esse era o termo próprio para tal coisa, fora colocado no soalho, formando uma espécie de caixa entre as traves. Ele encontrara esse revestimento, quando tentara furar o soalho.
E se toda a casa fosse assim?
Havia somente uma resposta para tudo aquilo: alguém estava na casa com ele!
"Towser" ouvira esse alguém ou farejara-o ou de qualquer outra maneira sentira-o e escavara freneticamente o chão numa tentativa de o apanhar, como se se tratasse de um leirão.
Excepto que , o que quer que fosse, não era por certo um leirão.
Desligou a lâmpada e subiu.
"Towser" estava enrolado sobre um tapete na sala de estar ao lado da poltrona e bateu com a cauda com um decoro polido para saudar o dono.
Taine parou a olhar para o cão. "Towser" devolveu-lhe o olhar com olhos satisfeitos e sonolentos, depois do que suspirou à maneira dos cães e pôs-se a dormir.
O que quer que "Towser" tivesse ouvido, cheirado ou sentido naquela manhã, era muito evidente que de momento ele já não tinha consciência de tal.
Então Taine recordou-se de outra coisa:
Enchera a chaleira para fazer café e colocara-a sobre o fogão. Ligara a placa e ela trabalhara logo à primeira vez. Não tivera de dar um pontapé no fogão para que a placa funcionasse.
Acordou na manhã seguinte, com alguém a prender-lhe os pés, e levantou-se imediatamente para ver o que havia. Mas não havia razão para alarme. Fora apenas "Towser" que se metera na cama com ele e agora estava estendido sobre os pés dele.
"Towser" resfolegou baixinho e as suas pernas traseiras tremeram como quando ele sonhava com a caça aos coelhos. 
Taine tirou os pés de debaixo do cão e levantou-se para se vestir. Ainda era cedo, mas ele lembrava-se de que deixara na camioneta a mobília que trouxera no dia anterior e tinha de tirá-la para baixo, para a arranjar.
"Towser" continuou a dormir.
Taine dirigiu-se à cozinha, um tanto a custo, e ao espreitar pela janela, viu Beasly, o homem dos sete ofícios dos Horton, acocorado no patamar traseiro. 

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