nº 374 - Agente de Bizâncio


Autor: Harry Turtledove
Título original: Agent of Bizantium
1ª Edição: 1987
Publicado na Colecção Argonauta em 1988
Capa: A. Pedro
Tradução: Eurico da Fonseca

Súmula - Foi apresentada no livro nº373 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta":

Harry Turtledove era (e é) um colaborador habitual das revistas de FC, apreciado, pelas suas histórias curtas.
Agente de Bizâncio é a primeira grande novela da sua autoria e diz muito do seu valor o facto de Isaac Asimov se ter dignado escrever para ela uma introdução que é um pequeno compêndio do que dentro da FC se pode chamar a ficção histórica.  
Suponha-se que num universo alternativo a história do Império Romano do Oriente seguia um rumo diferente, no qual Maomé, longe de criar uma nova religião, fora um arcebispo cristão, canonizado como São Maumet!
Nesse mundo diferente, em que o domínio e a riqueza do Império ultrapassam a imaginação, Basil Argyros é um dos magistriani do Imperador, o corpo de elite dos agentes (e espiões) imperiais.  
Argyros sabe que para lá das fronteiras há inimigos que dispõem de novas armas, incluindo uma que se diz ser terrível e que se chamaria... pólvora!  

Introdução

Isaac Asimov sente que a sua obra tem de ser continuada. Por isso está a promover novos autores de ficção-científica. A presente obra de Harry Turtledove, que por razões técnicas será dividida em dois volumes, é um exemplo do cuidado com que a selecção é feita. Leiam-se as palavras iniciais de Asimov e o prefácio de Turtledove e ter-se-á a certeza disso. 

Os "Se" da História - (Isaac Asimov)

Têm havido muitas ocasiões em que o destino da Humanidade parece ter estado suspenso de um único acontecimento que poderia ter tomado um ou outro rumo com probabilidades iguais. Que teria acontecido se Lincoln dissesse: Mãe, não tenho disposição para ir ao teatro esta noite. Dói-me a cabeça. Ou se a arma de Gavrilo Princip tivesse falhado quando ele a apontou a Franz Ferdinand da Áustria?
O meu favorito entre os "se" da História diz respeito a uma descoberta científica. Leo Szilard era um cientista húngaro que fora expulso da Europa pela política anti-semita de Hitler. Sabia que a cisão do urânio, recentemente descoberta, podia tornar possível uma bomba nuclear, e queria ter a certeza de que Hitler não a obteria primeiro. Esforçou-se para que os cientistas desse campo mantivessem segredo voluntariamente, reservando para si as descobertas que fizessem.  
Depois, com a ajuda de um par de colegas exilados, Eugene Wigner e Edward Teller, pediu a outro exilado, Albert Einstein, para escrever ao presidente Franklin Roosevelt, incitando-o a lançar um projecto secreto para construir uma bomba atómica antes que Hitler o fizesse. Szilard sabia que só Einstein possuía o peso bastante para ser persuasivo.
A carta foi enviada em 1941, Roosevelt deu-lhe ouvidos e, mais tarde nesse mesmo ano, assinou finalmente uma directiva que pôs em marcha o que viria a ser conhecido como o Projecto Manhattan.  
Assinou-a num sábado, e a nossa sociedade, sendo o que é, leva muitas vezes as pessoas a terem relutância a fazer qualquer coisa num fim-de-semana. Posso imaginar Roosevelt a atirar a caneta para a secretária nesse sábado e dizer, um tanto irritado: isso que vá para o diabo. Tenhamos calma. Será a primeira coisa que assinarei na segunda-feira. Teria sido uma atitude natural.  
Mas ele assinou-a num sábado, a 6 de Dezembro de 1941. Se tivesse esperado por segunda-feira, talvez nunca a assinasse, porque o domingo, 7 de Dezembro de 1941, foi o dia de Pearl Harbour, e depois disso, quando as coisas esfriaram, todo o negócio do Projecto Manhattan podia ter-se ido com as neves do ano passado. 
Que teria acontecido? A Alemanha teria obtido primeiro a sua bomba atómica? Teria a Segunda Guerra Mundial acabado sem a bomba e conseguiria a URSS produzi-la durante a Guerra Fria? Ninguém teria construído a bomba? Poder-se-iam escrever três histórias sobre três consequências diferentes deste pequeno "se" da História - se Roosevelt tivesse bocejado e dito: tratarei disso na segunda-feira
Não é fácil escrever uma história de um "se" da História. Uma pequena alteração pode originar outra e ainda outra., até um período posterior se tornar radical, quase incrivelmente diferente do que hoje consideramos ser a realidade. Ou, em alternativa, pode gerar uma diferença que, através de qualquer espécie de inércia social, consiga convergir até um período quase idêntico ao que chamamos realidade, excepto algumas mudanças curiosas - ou irónicas.
Os autores de ficção-científica atrevem-se de longe em longe a enfrentar essa dificuldade. Há dois exemplos que tenho recordado com amor através de décadas. Um é o de The Wheels of If, de L. Sprague de Camp, aparecido no Unknown de Outubro de 1940, e em que os maometanos tinham ganho a batalha de Tours, e a Igreja Céltica se tinha instalado nas Ilhas Britânicas, no lugar da Igreja Romana. O outro é Bring the Jubilee, de Ward Moore, que apareceu no Magazine of Fantasy and Science Fiction e apresentou um mundo em que a Confederação ganhara a batalha de Gettysburg e firmara a sua independência. Este último era particularmente tocante, porque as personagens dela procuravam imaginar as consequências se a União tivesse ganho a batalha e a América se tivesse mantido intacta. Que mundo utópico eles pensavam que tivesse resultado.
Bem, agora estamos perante outra tentativa de um complexo "se" da História. Que aconteceria "se" a tentativa de Justiniano de restabelecer o Império Romano não tivesse ido além das forças dele? E "se" o Império Bizantino pudesse ter detido os Zoroastrianos persas e "se" o Islão não tivesse surgido para destruir estes e enfraquecer permanentemente aquele? Teria Bizâncio sustentado a cultura greco-romana, intacta e completa, para o futuro?
Leiam o resultado que Harry Turtledove imaginou.

Prefácio:

Sou um autor de ficção-científica e um historiador. A combinação não é tão invulgar como parece- apra citar só alguns, Barbara Hambly, Katherine Kurtz, Judith Tarr, Susan Schwartz e John Carr usaram o que estudaram no colégio para dar profundidade e autenticidade aos mundos que criaram. No meu caso a ligação entre as duas coisas é ainda mais estreita. Se não fosse um leitor de ficção-científica, provavelmente nunca teria acabado por ser um estudioso da História Bizantina. Andava no liceu quando li Lest Darkness Falls - (publicado na Colecção Argonauta nº361 com o título A Luz e as Trevas), o clássico de L. Sprague de Camp, em que ele lançava um arqueólogo moderno na Itália do século sexto. Comecei a tentar descobrir o quanto era inventado por ele e quanto era real e fui apanhado. O resto, de várias maneiras, é história.
Este livro, portanto, assenta fortemente no meu fundo académico. Passa-se nos começos do século catorze de um mundo alternativo em que Maomé, em vez de fundar o Islão, se convertera ao Cristianismo numa missão comercial no interior da Síria. Em consequência, a grande explosão árabe dos séculos sétimo e oitavo, que no nosso mundo espalhou o Islão desde o Atlântico até às fronteiras da China, nunca aconteceu. O Império Romano (a que na sua forma medieval, oriental, damos o nome de Império Bizantino) nunca perdeu a Síria, a Palestina, o Egipto e o Norte de África para os invasores, nunca teve de lutar pela sua sobrevivência na Ásia Menor, ou de defender Constantinopla num sítio que, se perdido, teria levado o Império a cair em ruínas. 
Libertado dessa desesperada pressão no Leste, o Império teria tido uma intervenção meias activa na Europa Ocidental do que teve no nosso universo. Através dos séculos, retomaria a Espanha aos visigodos, a Itália aos lombardos, a maior parte do Sul da França aos francos. Para os estados ocidentais que mantinham a sua liberdade, Constantinopla seria tão invejável quanto temível. 
A leste, a história da Pérsia, a antiga rival de Roma, também diferiria muito do seu destino no nosso mundo. Sem as invasões árabes a deitá-la por terra, continuaria a se a outra grande potência no mundo a oeste da China, a única nação que poderia tratar o Império como igual. Por vezes os dois Estados entrechocar-se-iam abertamente; com maior frequência manobrariam para ganhar uma vantagem ali, para fomentar problemas nas que o outro ali tinha. Cada um de sua parte, continuaria a sonhar e a trabalhar para a vitória final que nenhum deles alguma vez vira.
Tal seria o mundo de Basil Argyros, soldado e agente do Império. Um mundo talvez mais conservador do que o nosso, pelo menos no sentido de ter mudado menos drasticamente desde os tempos clássicos. Mas nenhum mundo, como Argyros sabia (nem sempre para seu conforto), se mantém sempre o mesmo.
Uma nota final na cronologia: os bizantinos não usavam muito frequentemente a encarnação como ponto de partida para a sua era. O etos kosmou (ano do mundo) corria de 1 de Setembro a 31 de Agosto e era contado da Criação, que os estudiosos bizantinos datavam de 1 de Setembro de 5509 a.C.. Portanto o etos kosmou 6814, o ano em que esta história começa, decorre de 1 de Setembro de 1305 a 31 de Agosto de 1306. 

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