nº 217 - Um Estranho Numa Terra Estranha 1



Autor: Robert A. Heinlein
Título original: Stranger in a Strange Land
1ª Edição: 1961
Publicado na Colecção Argonauta em 1975
Capa: Lima de Freitas
Tradução: Eurico da Fonseca 


Súmula - Foi apresentada no livro nº216 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta":

Robert Heinlein é o mais antigo dos escritores de ficção-científica norte-americanos. É também o mais discutido. Ao escrever Soldado no Espaço (nº120 da Colecção Argonauta), foi acusado de defender o fascismo - mas hoje reconhece-se que se antecipou aos pensadores actuais, quanto à defesa da responsabilidade colectiva e ao respeito pelo valor dos soldados - entendidos como homens vindos do povo e representando o povo. Em Revolta em 2100 (nº132 da Colecção Argonauta), Heinlein mostrou pela primeira vez o seu excepcional poder de previsão sociológica, denunciando o fanatismo e a hipocrisia em geral e, muito principalmente, nos Estados Unidos. Em Revolta na Lua (nºs 119 e 120 da Colecção Argonauta e Entre Planetas (nº211), Heinlein foi além de si próprio, revelando-se um panfletário sem paralelo, condenando a colonização e a opressão, defendendo conceitos políticos quase sempre originais e profundamente revolucionários.
Mas a obra máxima de Robert A. Heinlein - obra máxima também do underground norte-americano, que um dia os homens perguntarão a si próprios porque razão não figurou entre os Prémios Nobel - é Stranger in a Strange Land. História imaginária, mas viva, do mais marginal dos homens - do homem que, criado por seres não humanos, nem sequer é considerado homem pelos homens - só agora pode ser publicada no nosso país. E por uma simples razão: Charles Manson, o protagonista do "caso Manson", identificou-se, desde muito novo, com Valentine Michael Smith - o Estranho Numa Terra Estranha.

Introdução:
  
Um Estranho Numa Terra Estranha é, talvez, a mais célebre obra de ficção-científica: a famosa Stranger in a Strange Land, verdadeira bíblia do underground norte-americano; análise poderosa e pungente do drama do verdadeiro marginal - do homem colocado à margem da humanidade pela sua cultura, pela diferente apreciação d valores, pela busca de uma pureza que contrasta com a cobiça, a ânsia de poder, a brutalidade da vida de todos os dias e de todos os "homens-bons".
Compreende-se, por isso, que Um Estranho Numa Terra Estranha, ainda que houvesse sido escrita em 1961, só agora seja publicada entre nós. Para além da força da sua mensagem - para além do seu carácter de "Bíblia dos Hippies" - havia o conhecimento das suas estranhas ligações com o caso Manson-Tate. Averiguou-se que Charles Manson - que nos fins de 1969 assassinou Sharon Tate - se deixara influenciar por Um Estranho Numa Terra Estranha, ao ponto de tentar reproduzir na sua vida muito do ambiente da obra. Assim, a "família" Manson não era mais do que a reprodução da "família" ou "ninho" em que o protagonista da obra teria sido criado, noutra "terra" - a de Marte. A submissão sexual e o abandono do ego ao chefe da "família", descritos também na obra, foram iguamente parte essencial do sistema de Manson. Mesmo a identificação de Manson com "Deus", Jesus ou "Satanás", tantas vezes afirmada no seu processo, nada mais era do que o reflexo de um período do livro: Entre os marcianos, há apenas uma religião - e essa não é uma Fé, é uma certeza: "Tu és Deus!".
Para Manson não havia a morte, mas apenas a "desencorporação", o "envio para o fim da fila, para tentar de novo" - a teoria da reencarnação, exposta na obra. O que, de certo modo, explica os seus crimes, cometidos como "simples castigos". Manson chegou até a dar ao seu filho o nome de Valentine Michael Smith - o mesmo do protagonista da obra, senhor de poderes hipnóticos e mágicos, a ele transmitidos pelos marcianos. E certo é que Manson possuía - ou fazia crer que possuía - fortes dons hipnóticos.
A identificação do caso Manson com o tema de Um Estranho Numa Terra Estranha não significa, todavia, que a obra seja doentia, anómala, maldita, no verdadeiro sentido de tais palavras. É antes, como se disse, uma obra profundamente humana, pois nela são desnudados todos os profundos valores e toda a profunda perfídia da alma humana. Que o seu autor seja Robert A. Heinlein, o mais antigo e o mais rebelde autor de ficção-científica norte-americano, é apenas natural para quem tem acompanhado a carreira daquele que escreveu páginas de génio como as de Soldado do Espaço, Revolta na Lua, Revolta em 2100, Sexta Coluna, Escala no Tempo, e tantas mais, e que, nessas páginas, se afirmou como um dos mais clarividentes sociólogos do nosso tempo - e dos tempos futuros.
Por razões técnicas, Um Estranho Numa Terra Estranha será dividido em 3 volumes.

Nota: uma das obras mais importantes de Robert A. Heinlein, ou pelo menos uma das que é  mais conhecida. Como referido no texto acima, tem uma espécie de maldição associada, visto ter constituído uma referência (segundo consta e referido pelo próprio), para o tristemente célebre Charles Manson, o responsável pelo assassínio da Sharon Tate, na altura esposa do realizador Roman Polanski. Todavia Manson, ao contrário do que é referido pelo editor, não assassinou Sharon Tate, embora tenha sido considerado responsável pelo acto. Quem cometeu o acto foi um grupo de indivíduos pertencentes ao seu grupo, à sua "família". Foram encontradas grandes quantidades de droga no local e o caso adquiriu contornos ainda mais dramáticos devido ao facto de Sharon estar grávida. Charles Manson foi condenado a prisão perpétua, estando preso no Estado da Califórnia, na prisão de Corcoran, onde também se encontra detido o assassino do Senador Robert Kennedy. As audiências para aferir a possibilidade de liberdade condicional têm tido ao longo do tempo sempre resposta negativa. A próxima será em 2027. Nesse ano, se ainda for vivo, Charles Manson fará 93 anos.

3 comentários:

  1. Mais uma obra memorável do Heinlein. Nunca li esta versão, li a da Europa-América e nunca me esquecerei do grocar... Já agora alguem leu as duas e tem uma opinião sobre as traduções?

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    1. Esta tradução é muito superior à da Europa-América (o que, convenhamos, nem é muito difícil...)

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    2. Curiosa a menção, na súmula, ao facto de só em 1975 ter sido possível a publicação desta obra na colecção. Penso até ser a única vez que a censura fascista é mencionada explicitamente pelo editor

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