nº 276 - O Feiticeiro de Terramar



Autor: Ursula Le Guin
Título original: A Wizard of Earthsea
1ª Edição: 1968
Publicado na Colecção Argonauta em 1980
Capa: A. Pedro
Tradução: Eurico da Fonseca 

Súmula - Foi apresentada no livro nº275 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta":  

A chamada American New Wave, que teve como figuras de vanguarda autores como Thomas Disch, Samuel R. Delany, Roger Zelasny, etc, é por muitos considerada como uma reacção à crise daquilo que se pode chamar a "ficção-científica mecanicista", perante a realização de muitas das suas previsões, nomeadamente no campo da exploração do espaço cósmico. A New Wave caracterizou-se, de facto, pela busca de novos estilos literários e também de novos assuntos - substituindo de certo modo a science-fiction pela speculative-fiction. Daí resultaram obras de choque como Camp Concentration, de Disch - uma história simbólica e filosófica sobre o desenvolvimento da inteligência humana através de uma droga extraída da bactéria da sífilis. No entanto, a expansão deste movimento literário foi muito prejudicada pelo abuso do jogo de palavras - e, por vezes, de ideias -  intraduziveis ou muito dificilmente compreensíveis noutras línguas e culturas. No fim dos anos 60, a New Wave - de leitura difícil, mesmo na língua inglesa, dada a sua forte carga de surrealismo - acabou por se tornar uma sub-categoria da SF, e a rebelião por ela anunciada extinguiu-se. Tudo quanto dela ficou foi uma perspectiva mais larga, uma maior aceitação de temas até então ignorados ou desprezados.
Um desses temas é o da feitiçaria. Até à década de 60 - até ao aparecimento da New Wave, ninguém considerava como de SF uma novela em que a feitiçaria ou a magia tivessem um papel importante ou dominante. Mas hoje já não se pensa assim, o que explica que autores como Randall Garrett e Cliford D. Simak o tenham escolhidos para algumas das suas obras. No entanto, será dificil dizer que O Feiticeiro de Terramar  - a próxima obra da Colecção Argonauta - versa também o tema da feitiçaria e da magia. Só na aparência isso acontece. A realidade é outra - a sua autora, Ursula Le Guin, pela primeira vez traduzida na nossa língua, foi um dos elementos mais importantes da New Wave e é hoje um dos maiores nomes da SF. O Feiticeiro de Terramar (A Wizard of Earthsea) é a primeira obra da célebre Earthsea Trilogy, uma descrição maravilhosa e extremamente meticulosa de um mundo diferente, em que os valores mais íntimos - mais humanos -são focados de uma maneira sem igual.
Acrescente-se que Ursula Le Guin, longe das experiências estilísticas dos outros membros da New Wave, usa uma linguagem fácil embora magistral - afirma-se hoje que ela, em matéria de qualidade, é a "pedra-de-toque" da SF. Por isso, muito embora quando da sua publicação, em 1968, A Wizard of Earthsea fosse apresentado como uma novela juvenil, certo é que esse carácter foi desde logo ignorado, e o mesmo aconteceu com as outras obras da trilogia - The Tombs of Atuan (1971) e The Fasthest Shore (1972).
No entanto, a Trilogia de Terramar foi apenas o começo de uma carreira que se pode considerar sem igual. Já em 1969, em The Left Hand of Darkness, Le Guin mostrara a sua capacidade para tornar a SF num autêntico instrumento de intervenção social. Em 1972, essa tendência definiu-se com uma pequena novela de grande impacto: The Word for World is Forest, uma denúncia da exploração imperialista em torno da descrição de uma cultura alienígena, fascinante, em que o sonho tem um papel determinante, pois é considerado como tão válido como a realidade.
Em 1974 surgiu a obra máxima de Le Guin: The Dispossessed. Tendo por subtítulo Uma Utopia Ambígua,  é a descrição de uma sociedade anarquista - e é uma obra  perfeitamente integrada na corrente tradicional - científica - da SFThe Dispossessed obteve os prémios Hugo e Nebula. Não vulgar que uma obra consiga obter os dois prémios, mas mais raro ainda é que isso aconteça pela segunda vez a um mesmo autor: Ursula Le Guin obtivera cinco anos antes os mesmos galardões com The Left Hand of Darkness! Dito isso, tudo estará dito.

Introdução: (reproduz com ligeiras diferenças a súmula)
A chamada American New Wave, que teve como figuras de vanguarda autores como Thomas Disch, Samuel R. Delany, Roger Zelasny, etc, é por muitos considerada como uma reacção à crise daquilo que se pode chamar a "ficção-científica mecanicista", perante a realização de muitas das suas previsões, nomeadamente no campo da exploração do espaço cósmico. A New Wave caracterizou-se, de facto, pela busca de novos estilos literários e também de novos assuntos - substituindo de certo modo a science-fiction pela speculative-fiction. Daí resultaram obras de choque como Camp Concentration, de Disch. No entanto, a expansão deste movimento literário foi muito prejudicada pelo abuso do jogo de palavras - e, por vezes, de ideias - que tornava intraduzíveis ou muito dificilmente adaptáveis as obras por ela produzidas. No fim dos anos 60, a New Wave - de leitura difícil, mesmo na língua inglesa, dada a sua forte carga de surrealismo - acabou por se tornar uma sub-categoria da SF, e da rebelião por ela anunciada ficou apenas uma perspectiva mais larga, uma maior aceitação de temas até então ignorados ou desprezados.
Um desses temas é o da feitiçaria. Até à década de 60, ninguém considerava como de SF uma novela em que a feitiçaria ou a magia tivessem um papel importante ou dominante. Mas hoje já não se pensa assim, o que explica que autores como Randall Garrett e Cliford D. Simak o tenham escolhidos para algumas das suas obras. No entanto, será dificil dizer que O Feiticeiro de Terramar tenha também por tema predominantemente a feitiçaria e a magia. Só na aparência isso acontece. A realidade é outra - a sua autora, Ursula Le Guin, pela primeira vez traduzida na nossa língua, foi um dos elementos mais importantes da New Wave e é hoje um dos maiores nomes da SF. O Feiticeiro de Terramar (A Wizard of Earthsea) é a primeira obra da célebre Earthsea Trilogy, iniciada em 1968, completada com The Tombs of Atuan, em 1971, e The Farthest Shore, em 1972. A trilogia, destinada inicialmente ao público juvenil, acabou por se tornar num dos grandes clássicos da nova SF - nomeadamente pela descrição ímpar, em linguagem clara, mas muito rica, do estranho mundo de Terramar, um arquipélago vivendo na noite dos tempos, em que as dimensões humanas atingem uma amplitude e uma profundidade poucas vezes conseguidas em qualquer tipo de literatura.
Importa dizer que a Trilogia de Terramar é apenas o princípio de algo ainda maior - muito maior. Em 1969, com a sua segunda novela - The Left Hand of Darkness - Ursula Le Guin obteve os prémios Hugo e Nebula. A sua capacidade de tornar a SF num autêntico instrumento de intervenção social acentuou-se em 1972 com uma novela pequena, mas de grande impacto: The Word for World is Forest, uma denúncia da exploração imperialista, num mundo em que existe uma cultura fascinante, na qual o sonho tem um papel determinante, pois é considerado como uma forma de realidade. Em 1974 surgiu a obra máxima de Le Guin: The Dispossessed, que tem por subtítulo Uma Utopia Ambígua e é a descrição, muito cuidada, de uma sociedade anarquista, integrando-se todavia perfeitamente na corrente tradicional - científica - da SF. The Dispossessed obteve também os prémios Hugo e Nebula. Não é de modo nenhum vulgar - pode-se mesmo dizer que é único - o facto de um autor ver duas das suas novelas receberem os galardões máximos da SF, e isso explica que se diga que Ursula Le Guin é hoje a "pedra-de-toque", o padrão máximo de qualidade - de tal género literário.

Nota: a saga de Ged, o jovem feiticeiro, acompanhou-me durante toda a minha infância e juventude. Este livro e os dois que se seguem na saga, Os Túmulos de Atuan (nº 284) e O Outro Lado do Mundo (nº 293), foram talvez os livros que li mais vezes da Colecção Argonauta. Tenho sempre saudades desta saga e releio-a sempre com imenso gosto. Posteriormente, foram lançados pela Ursula Le Guin um 4º livro e depois um 5º que revisitam a saga, mas que ainda não li. Sinceramente, até tenho medo de os ler. Estes três livros formam um conjunto perfeito. E por vezes não se deve mexer no que é perfeito.
Também me questionei algumas vezes sobre se a J.K.Rowling não se terá inspirado neste livro para criar a história de Harry Potter.

4 comentários:

  1. Meu bom amigo,
    adorei que me tivesses dado a conhecer este livro, a sua coleção e a autora.
    Já desestabilizaste o meu dia... :P Mas por um bom motivo! Venham muitos como este. :)

    Fiquei curioso com a sugestão que me fizeste, e parti de imediato à procura na Internet. Ainda bem que forneceste o nome original, pois sei isso seria bem mais difícil. :-)

    Devo reconhecer que fiquei surpreendido com o que li sobre o livro e a trilogia, e ainda pela quantidade de prémios da autora, que pelos vistos foi mesmo uma pioneira neste tipo de escrita. Eu não conhecia nada disto, mas também não é de estranhar: ainda nem era nascido! ehehe

    Felizmente esses livros estão disponíveis na Web e até já encontrei em formato ePub, pelo que vou colocaá-lo no topo da minha lista de leitura.

    É curioso que nem acabei de ler isto, e parti logo À procura. Mas agora que já encontrei o livro, voltei aqui para fazer um comentário,e li mesmo no fim, que tu dizes aqui aquilo que de imediato me veio à cabeça depois de ter lido um comentário que ela fez sobre os motivos que a levaram escrever esta trilogia. Eu ainda nem li, mas realmente parece que ela poderá mesmo ter servido de inspiração para o Harry Potter. Eu não o posso dizer pois ainda não li os livros, mas pelo que li da sinopse e pelo que li da própria autora, nao ficaria nada admirado.

    Vou ler dentro em breve.
    Muito obrigado!
    E esta tua dedicação bem merecia alguma ajuda da editora... ;-) Se eles me lerem...

    Abraço

    Agos

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    1. Viva,

      Ainda bem que pelo menos "a priori" te interessou! Garanto-te que vais encontrar nesta colecção muitas obras fantásticas, algumas das quais sem dúvida já conhecerás.

      Sugiro, só por agora, que espreites também o nº 330, e também o nº 331 e o nº 332...

      Quanto à "ajuda" da editora, os "Livros do Brasil" sempre, pelo menos em relação a esta colecção, se pautaram por um certo distanciamento com os leitores. Mudavam o aspecto das capas sem informar, houve pelo menos 2 casos em que repetiram números já publicados como se de novos números se tratassem... houve ainda o famoso caso do nº 130A (podes inteirar-te no livro respectivo)...

      E o que fizeram no final da colecção, ao aumentarem o preço e sobretudo ao abandonarem o formato da colecção com mais de 50 anos, não é decisão que, na minha modesta opinião, honre nem o património histórico construído, nem a memória da colecção, nem os leitores que a suportavam há longos anos, tendo revelado no meu entender uma profunda falta não só de sensibilidade como mesmo uma péssima gestão.

      Além disso... a colecção já não é publicada. E sinceramente, eu com isto não pretendo ganhar nada. Este blog é uma homenagem minha à Colecção Argonauta apenas, pelo que ela significou para mim e para muitas pessoas, independentemente dos critérios que penso que nem sempre terão sido os melhores da editora. Mas também é verdade que penso que devemos olhar mais para o que de bom foi feito e menos para o que se fez menos bem. Convenhamos que foi uma colecção ímpar, que encantou gerações, e que se olharmos para o número de anos (mais de 50) que esta durou, os erros graves que me parecem ter sido 4 ou 5 no máximo, perdem realmente um pouco de significado.

      Este meu projecto é mesmo uma homenagem e para partilha, como refiro no texto inicial.

      Obrigado e um abraço.

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  2. os famosos estúdios Ghibli fizeram um filme inspirado nesta obra desta grande escritora
    http://site.studioghibli.com.br/filmografia/contos-de-terramar/
    abraço e parabéns pelo fantástico blog.
    mp

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    1. Obrigado pela mensagem, Miguel Pedro. É sempre gratificante sentir que o nosso trabalho é apreciado.
      Conheço o filme dos estúdios Ghibli, temos cá em casa a colecção toda :)
      E como refiro no comentário inicial, penso que também é possível que a J.K. Rowling se tenha inspirado nesta obra relativamente à saga do Harry Potter.
      Obrigado e um abraço.

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