nº 168 - A Guerra dos Fantasmas



Autor: Lloyd Biggle, Jr.
Título original: The Angry Espers
1ª Edição: 1961
Publicado na Colecção Argonauta em 1971
Capa: Lima de Freitas
Tradução: Eurico da Fonseca 

Súmula - foi apresentada no livro nº167 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta": 

Lloyd Biggle, Jr. é um autor já conhecido dos leitores da Colecção Argonauta. Recorde-se, por exemplo, a sua obra All The Colours of Darkness, incluída sob o título Partida Sem Chegada na nossa Colecção, com o nº147.
A Guerra dos Fantasmas é uma obra invulgar, como aquela. O seu tema, como hoje já é hábito dizer, é "transcientífico". Situa-se para além da ciência actual. Mas isso não significa que seja inverosímil. Há de facto muita coisa, no mundo em que vivemos, que as leis da física não explicam, e o que sabemos dos poderes do espírito não chega para esclarecer. Coisas que quase pertencem ao domínio do oculto, não porque alguém as esconda, mas sim porque os homens da ciência as negam - sem as investigarem. Sem se recordarem de que a ciência tem na sua base um método que não pode ser ignorado. O que manda estudar os fenómenos, sejam eles quais forem - sejam eles demasiadamente incompreensíveis. "Transcientíficos". Como a telepatia. Como a telecinética, por exemplo.
Deste extraordinário romance de FC, damos aos leitores o seguinte excerto:

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Estava suspenso num vácuo delicioso de não-sensações e a sua consciência regressava lentamente, mas como uma rude intrusa. Resistiu a ela, pondo de parte os frágeis torvelinhos de pensamentos, até que o seu espírito atrevidamente fez uma pergunta: Onde estou eu?
O espírito respondeu-lhe: Num hospital.
Vira suficientemente o planeta ao cair para compreender que havia nele uma civilização desenvolvida. A ciência médica devia ser muito adiantada e estavam a dar-lhe uma magnífica atenção. Se não fosse assim, teria despertado num inferno de dor, em vez daquele delicioso nãos sentir nada. Ou talvez não tivesse despertado. Tinha-se já convencido de que as probabilidades se encontravam formidávelmente do lado de não ter despertado quando viu o chão a saltar na direcção dele.
Abriu os olhos.
A sala oscilava numa luz azul nebulosa. À volta dele debruçavam-se batas azuis pálida. Dois homens com rostos solenes observavam-no gravemente, à maneira misteriosa dos médicos. Havia neles uma aura de simpatia, de poder de sarar.
Ele tinha os membros imobilizados e olhou para eles. O seu espírito flutuava com langor, uma coisa separada do corpo inerte. Devia ter realizado um excelente trabalho, ao esmigalhar-se, pensou ele.
Um súbito alarme tornou tensas as expressões dos rostos à sua volta. A mudança foi tão drástica, tão surpreendente, que o pânico o dominou e ele tentou, aflito, erguer um braço ou mover a cabeça. Sabia que não podiam compreender a sua linguagem, mas no seu desespero, disse:
- Chamo-me Paul Corban. Sou aspirante da Armada do Espaço da Federação Galáctica. A minha base...
Eles afastaram-se. Não houve mais que um abrir e fechar de olhos entre o momento em que estavam presentes junto dele e o vazio desanimador do tecto azul que se curvava sobre a sua cabeça. Gritou como um louco.
Ninguém lhe respondeu. Nem sequer um eco longínquo, a imitá-lo.
Gritou de novo quando o seu espírito foi dominado pelo terror de estar absolutamente só e indefeso. Ninguém apareceu e ao fim de algum tempo ele acalmou-se e adormeceu de novo. A ausência de sensação já não era um prazer e o seu sono foi perturbado pela recordação dos olhares de espanto com que os dois médicos o tinham fitado - expressões de repugnância indizível, impiedosa.
Um novo rosto pairou sobre o seu quando ele despertou. Era uma mulher, jovem, que poderia ser atraente se não fosse o penteado que impusera o corte dos seus cabelos em volta das orelhas e os amontoara no alto, dando ao seu rosto uma expressão pesarosa e alongada. A bata era azul-escura.
A mulher colocou-lhe um tubo na boca. Estava ligado a qualquer coisa que se encontrava fora do seu campo de visão. Ele tinha fome e bebeu com avidez aquela espécie de sopa, espessa e saborosa.
A atitude da mulher surpreendeu-o. Ele estava deitado de costas, impotente, e só podia mover os olhos e os lábios. Por certo que não tinha uma aparência ameaçadora. Mas havia apreensão no seu rosto, desconfiança - quase medo.
E repugnância. Uma repugnância indisfarçada. Como se ela houvesse sido condenada a cuidar de um réptil horroroso de origem incerta.
Ele falou à volta do tubo:
- Porque é que você me odeia?
Ela pestanejou e a firmeza dos seus lábios sublinhou o seu silêncio. Ele continuou a observá-la enquanto sorvia a sopa. O rosto da mulher empalidecera súbitamente enquanto ele falava, ou fora ele que imaginara isso? Ela não o podia compreender. Era-lhe estranha, talvez mais do que podia imaginar, e era talvez uma loucura tentar interpretar as emoções de um ser estranho através de expressões faciais. 
Acabou a sopa e largou o tubo. A mulher desapareceu - não fez qualquer movimento. No mesmo instante o rosto dela estava e deixara de estar debruçado sobre ele. E ele olhava o tecto, a pestanejar.

1 comentário:

  1. Luiz Eduardo Ferreira da Silva4 de agosto de 2012 às 15:18

    Um livro magnífico que li quando ainda era um adolescente! Que saudades!

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