nº 386 - Roderick



Autor: John Sladek
Título original: Roderick
1ª Edição: 1980
Publicado na Colecção Argonauta em 1989
Capa: A. Pedro
Tradução: Samuel Soares

Súmula - Foi apresentada no livro nº385 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta":

John T. Sladek nasceu no Iowa em 1937 e vive actualmente em Londres. Estudou na Universidade de Minnesota, Engenharia Mecânica e Literatura Inglesa. desde então, tem trabalhado como escritor técnico, empregado de bar, desenhador e ferroviário. A sua obra Roderick, foi nomeada para o National Book Award de 1981.
Eis as primeiras páginas de Roderick:

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Não existe qualquer segurança contra o derradeiro desenvolvimento da consciência mecânica no facto de as máquinas possuírem agora reduzida consciência. Um molusco também não dispõe de grande consciência. Reflictam no extraordinário avanço que as máquinas sofreram nos últimos cem anos e repararão quão lentamente os reinos vegetal e animal estão a avançar. 
                                                                                                            Samuel Buttler, Erewhon

Jean Harlow (no papel Kitty Packard): "Li num livro... que as máquinas vão tomar conta de todas as profissões!"

Marie Dressler (no papel de Carlotta Vance, que trata dela): "Não tens motivos para te preocupares, minha querida."
                                                                                                              de Dinner at Eight

A Primavera chegou à Universidade de Minnesota na forma de uma tempestade à meia-noite, espalhando neve a todo o comprimento do grande "campus", incomodando as pessoas desde a Faculty Hill até lá abaixo à Fraternity Row.
Na reunião de Ibsen Club, um orador muito idoso e cansativo principiou a explicar que Boreas estava - hi, hi! - provavelmente a tentar penetrar nos celeiros de cimento do Departamento de Agricultura Científica para emprenhar as éguas - oh, oh! -, então nos dias que vão correndo as pessoas pensavam que tudo era feito por máquinas, eh? Esperma congelado por algum garanhão já morto, eh? Administrado por alguma máquina mais fria e mais rápida e mais impiedosa do que o pobre do velho Boreas - hi, hi! -, e assim sucessivamente, afastando-se cada vez mais da discussão que travavam sobre Nora Heimer.
Em sua casa, a Dra. Helen Boag, directora de Pessoal, acordou e chamou por Harry, o seu segundo marido:
- Que se passa, Harry? Que é esse barulho?
- Mas o monte de roupa de cama que se encontrava a seu lado continha o terceiro marido, Dave. E o vento já passara. 
Nos Serviços de Saúde da Universidade, um bocejante interno serviu-se de um baixa-línguas para marcar a página de "O Âmago da Matéria" ("Algures, ao longe, ele pensou ter ouvido sons de dor") e decidiu encomendar mais vacinas para a gripe... com um vento daqueles. Rodou a cadeira articulada para a consola do computador e principiou a dedilhar as teclas. Em tempo praticamente nulo, conseguiu encomendar três triliões - ufa, mil, três mil "doches" - doses, raios, doses!
Alguém na Digamma Upsilon Nu incitou o vento a soprar, soprar até estourar os tomates, rindo-se com suficiente gosto para cuspinhar mais cerveja por cima do já humedecido piano, junto do qual os membros da irmandade já se tinham reunido para despejarem umas canecas e cantarem Roll Me over, com as vozes a esforçarem-se por competir com o louco uivo lá de fora. Na verdade, mal se faziam ouvir pelo solitário irmão que se esgueirara para o andar de cima, para se sentar de revólver na mão, a reflectir na sua média de curo. O sistema, Cristo, como ele era injusto, tão tremendamente injusto, estava a degradar-se, que raio de piada, que raio de vida, ainda que uma pessoa encomendasse o horóscopo a todos os seus computadores...
No preciso momento em que punha a arma de parte, o fantasma que lhe batera à janela (parecendo uma pancada na porta) encontrava-se já longe, experimentando outras portas, outras janelas...
Assobiava através da espiral da Mee Interdenominational Kirk O' Th' Campus, onde não existiam grandes tubos de órgão para guincharem em resposta - tubos, órgão e até mesmo o organista -, tendo sido substituídos por uma simples e modesta maquineta que (se algum dia o Pastor Bean a conseguisse programar) se animaria somente para contar orações ao Deus Ecuménico Wee, em fila, por ordem numérica.
Próximo da Igreja jazia um corpo mutilado; o vento cobriu-a decentemente com neve, para aguardar o trabalho estatístico do computador da Polícia e continuou a uivar, rugindo pelo Mall abaixo, rasgando um velho cartaz de ballet, incomodando um cesto de papéis e guinchando finalmente para além do edifício da Ciência dos Computadores. Aí, o vento empurrou firmemente o Dr. Fong contra a porta que estava a tentar puxar. 
- Deixe-me ajudá-lo. - Ouvi a voz antes de poder distinguir o vulto, uma espécie de fantoche mal manobrado, a ser obrigado a deslocar-se em pontas de pés: Rogers.
- Oh, é você. - Recuou, segurando o seu chapéu russo com ambas as mãos, enquanto o Professor Rogers lutava com a porta. A neve esvoaçava no ar, em torno deles, num bruxeleio de ocasionais flocos; o vento fornecia o ruído de fundo. 
No interior, os dois homens detiveram-se para bater com os pés e tirar os óculos embaciados.
- É você - repetiu Fong - A estas horas da noite?
- Não conseguia dormir. A pensar em... oh, em todas estas malditas coisas. Na viabilidade...
- O rosto dele não fornecia mais explicações. Na verdade, sem os óculos fumados, a sua cara era simplesmente longa e vazia de expressão, como uma casca de amendoim. Nada se via nela a não ser marcas de bexigas.
- Queria dar uma vista de olhos ao projecto?
- O que queria era explorar... os níveis de aceitabilidade.
- O quê?
- Testar a infraestrutura do nosso pequeno grupo, percebe? Procurar um catalisável, orientado pelo sistema... está a ver, tinha a certeza de que o senhor ou o seu assistente se encontrariam por aqui... 

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