nº 547 - O Verão de Helliconia 1



Autor: Brian Aldiss
Título original: Helliconia Summer
1ª Edição: 1983
Publicado na Colecção Argonauta em Setembro de 2003
Capa: António Pedro
Tradução: Alexandra Rolão Tavares
Revisão: Dália Moniz

Súmula - foi apresentada no livro nº546 da Colecção, com a indicação de "Ler nas páginas seguintes a súmula do próximo volume da Colecção Argonauta":

As ondas escalavam a encosta da praia, recuavam, e voltavam novamente.
A pouca distância, no mar, a procissão de vagas acabadas de chegar era quebrada por uma massa rochosa coroada de vegetação. Era marcava uma divisão entre as profundezas e os baixios. Antigamente, a rocha tinha feito parte de uma montanha no interior, até que as convulsões vulcânicas a arremessaram para a baía. 
A rocha estava agora domesticada por um nome. Era conhecida como sendo a Rocha de Linien. A baía e o local tinham sido baptizados com o nome de Gravabagalinien, por causa da rocha. Para além desta, jaziam os azuis cintilantes do Mar das Águias. As ondas que salpicavam a costa eram saturadas pela areia antes de se dispersarem numa saraivada de espuma branca. A espuma percorria a encosta, para mergulhar voluptuosamente na praia.  
Depois de se encapelarem em volta do bastião da Rocha de Linien, as ondas encontravam-se em ângulos diferente na praia, rebentando com um vigor redobrado para redemoinharem em volta dos pés de um trono dourado que estava a ser colocado na água por quatro "fagores". Na água, encontravam-se mergulhados os dez dedos rosados dos pés da Rainha de Borlien.
Os "ancípites" sem chifres permaneceram imóveis. Sem mais do que um acenar de uma orelha, permitiram que a enchente leitosa fervilhasse em volta dos seus pés, muito embora receassem a água. Apesar de terem trazido a sua carga durante mais de mil e quinhentos metros desde o palácio de Gravabagalinien, não exibiam quaisquer sinais de fadiga. Embora o calor fosse intenso, não mostravam quaisquer sinais de desconforto. Nem sequer exibiram qualquer interesse quando a rainha avançou nua do seu trono até ao mar.
Atrás dos "fagores", na areia seca, o mordomo do palácio supervisionava os dois escravos humanos enquanto estes erigiam uma tenda, que ele encheu com as esplendorosas carpetes "Madi".
As ondas acariciavam os tornozelos da Rainha Myrdem-Inggala. A "rainha das rainhas", era o que os camponeses de Borlien lhe chamavam. Com ela, encontrava-se a sua filha e do rei, a Princesa Tatro, e algumas das companheiras habituais da rainha. 
A princesa gritava de entusiasmo e dava saltos. Com a idade de dois anos e três meses, ela considerava o mar um amigo amplo e insensato.
- Oh, olha só para esta onda que se aproxima, Moth! A maior que já vi! E a próxima... aí vem ela... oooh! É um monstro, tão alta como eu! Oh, estão a tornar-se cada vez maiores! Cada vez maiores, Moth! Moth, Moth, OLHA! Olha só para esta agora, vê, vai rebentar, e... ooh, aí vem outra, ainda maior! Olha, olha, Moth!
A rainha acenou com a cabeça com gravidade ao ver o deleite da sua filha com as pequenas ondas serenas, e ergueu o olhar para cima. As nuvens cor de ardósia empilhavam-se no horizonte a sul, a anunciarem a aproximação da estação das monções. As águas profundas tinham um tom para o qual a palavra "azul" não era uma descrição adequada. A rainha viu tons de anil, verde-mar, turquesa, e verde-óxido. No seu dedo, exibia um anel que lhe tinha sido vendido por um mercador em Oldorando com uma pedra - invulgar, e de uma origem desconhecida - que condizia com as cores do mar da manhã. Sentiu  que a sua vida e que a vida da sua filha estavam ligadas, tal como a pedra estava ligada ao oceano.
Daquele reservatório de vida provinham as ondas que encantavam Tatro. Para a criança, cada vaga era um acontecimento separado, experimentado sem qualquer relação com o que tinha passado e o que estava por vir. Cada onda era única. Tatro ainda se encontrava naquele presente eterno da infância.
Para a rainha, as ondas representavam uma operação contínua, não apenas do oceano, mas do processo do mundo. Este processo incluía a rejeição do seu marido, os exércitos em marcha para além do horizonte, a expansão do calor, e a vela que ela esperava todo os dias ver no horizonte. Passado ou futuro, ambos se encontravam contidos no seu arriscado presente.
Dizendo adeus a Tatro, a rainha correu em frente e mergulhou na água. Tinha-se separado da pequena figura hesitante nos baixios, para desposar o oceano. O anel cintilou no seu dedo quando as suas mãos deslizaram sobre a superfície e ela começou a nadar.  

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